Você já deve ter ouvido essa estatística que pode parecer surpreendente para quem não está familiarizado: todo verão, o consumo de sorvetes e o número de afogamentos evoluem em conjunto, como se houvesse o risco de se afogar... ao comer um sorvete. Essa "dualidade" surpreendente muitas vezes gera piadas, mas principalmente ilustra uma armadilha clássica da mente humana: confundir correlação com causalidade.
Calor, sorvetes e banhos
Quando a temperatura sobe de forma persistente, nosso organismo busca eliminar o excesso de calor. Dois reflexos simples são acionados:
- Se refrescar no lanche: O sorvete ou o sorbet oferecem um resfriamento imediato do paladar e um prazer gustativo. Entre 12h e 18h, as vendas de sorvetes aumentam de forma espetacular em mercados, praias e quiosques.
- Entrar na água: Nadar no mar, no rio ou na piscina se torna um remédio natural contra o calor. Mas quanto mais pessoas entram na água, mais aumentam as chances de escorregar, se cansar ou enfrentar correntes, e portanto, o risco de acidentes por afogamento.
Esses dois comportamentos não estão ligados por uma relação de causa e efeito: não é o "toque" de limão gelado que faz você perder o equilíbrio, nem a promessa de um nado que desperta o desejo por sorvete de baunilha com pistache. Eles simplesmente compartilham um mesmo motor: o calor do verão.
Por que a correlação?
Falamos de fator de confusão quando duas variáveis evoluem juntas sob a influência de um terceiro elemento. Aqui, o sol e o aumento das temperaturas desempenham esse papel: eles fazem subir, por um lado, a demanda por sobremesas geladas e, por outro, o número de banhistas expostos aos riscos aquáticos.
Esse fenômeno está longe de ser anedótico: ele nos lembra que nossos cérebros buscam automaticamente dar sentido a coincidências numéricas, com uma tentação de estabelecer relações de causa e efeito ao observar duas curvas paralelas.
Explicação matemática
Para medir a força de uma relação estatística entre duas variáveis, usamos o coeficiente de correlação de Pearson, denotado por r. Ele é calculado assim:
r = Cov(X, Y) / (σₓ · σᵧ)
Onde, por exemplo:
-
X é o consumo de sorvetes (em litros ou toneladas)
-
Y é o número de afogamentos (número de acidentes)
-
Cov(X, Y) é a covariância (medida de como X e Y variam juntas)
-
σₓ e
σᵧ são os desvios padrão de X e Y (medida de sua dispersão individual)
O coeficiente r varia entre –1 e +1:
- r próximo de +1 indica uma forte correlação positiva (as duas variáveis aumentam juntas).
- r próximo de –1 sinaliza uma forte correlação negativa (uma aumenta, a outra diminui).
- r próximo de 0 significa ausência de correlação linear.
Neste caso, poderíamos ter r > +0,80, mostrando uma correlação positiva muito forte. Mas atenção: a correlação não diz nada sobre causalidade. Para demonstrar que X causa Y, seria necessário isolar todas as outras variáveis possíveis, o que aqui é impossível — a verdadeira causa comum continuando sendo o calor.
Conclusão
O paralelo entre o pico de vendas de sorvetes e o aumento de afogamentos é um excelente exemplo de "correlação enganosa": dois fenômenos que ocorrem juntos sem que um cause o outro. É o calor que leva tanto a saborear um sorvete quanto a mergulhar na água, com seus riscos. Entender esse fato nos ajuda a manter um espírito crítico diante de gráficos e estatísticas, e a preservar o prazer intacto: saboreie seus sorvetes com segurança e respeite as orientações de banho para evitar acidentes.