Um fenômeno raríssimo acaba de ser observado no CERN. A desintegração de um káon carregado em píon e neutrinos intriga os cientistas.
Esse processo, extremamente raro, pode abrir uma nova porta para fenômenos físicos desconhecidos. O experimento NA62 está no centro dessa descoberta.
O experimento NA62 tem cerca de 270 metros de comprimento e está alojado nas cavernas TCC8 e ECN3 da zona norte do CERN.
Imagem: M.Brice/CERN
O káon, uma partícula subatômica, se desintegra em um píon, acompanhado de um par neutrino-antineutrino. Esse fenômeno é tão raro que o Modelo Padrão prevê menos de um evento para cada 10 bilhões de káons. Essa baixa probabilidade fascina os físicos, pois pode revelar uma nova física, além da nossa compreensão atual. A equipe do NA62 projetou dispositivos específicos para observar essa desintegração.
Cristina Lazzeroni, professora na Universidade de Birmingham, destaca a importância dessa observação. Para ela, é um dos eventos mais raros já registrados, com um nível de certeza atingindo o famoso "5 sigma". A colaboração entre os pesquisadores foi essencial para alcançar esses resultados.
Produzidos graças a um feixe intenso de prótons acelerados pelo Super Sincrotrão de Prótons do CERN, os káons são isolados em um feixe de partículas secundárias direcionado ao detector NA62. Esse detector mede os produtos da desintegração dos káons com grande precisão, em especial os píons, os únicos produtos detectáveis.
Giuseppe Ruggiero, da Universidade de Florença, lembra que essa descoberta é fruto de mais de uma década de esforços. Segundo ele, a probabilidade extremamente baixa dessa desintegração tornou a tarefa difícil, mas o resultado é uma recompensa à altura do esforço investido.
Os dados vêm de experimentos realizados entre 2021 e 2022, após a adição de melhorias técnicas. Graças a uma maior intensidade de feixe e uma análise mais refinada, a equipe conseguiu identificar mais sinais potenciais enquanto reduzia os erros de medição.
A equipe NA62 se concentra nesse processo de desintegração porque ele é particularmente sensível a novas teorias físicas. Embora os resultados atuais correspondam às previsões do Modelo Padrão, um pequeno aumento observado pode sugerir a existência de novas partículas.
Os próximos anos serão decisivos para confirmar ou refutar a existência dessas novas teorias.
O que é o Modelo Padrão na física de partículas?
O Modelo Padrão é a teoria que descreve as partículas elementares e suas interações fundamentais. Ele agrupa três das quatro forças fundamentais do Universo: o eletromagnetismo, a força nuclear forte e a força nuclear fraca. A gravitação, no entanto, não está inclusa.
Essa teoria organiza as partículas em duas categorias principais: os quarks e os léptons. Os quarks formam os prótons e nêutrons, enquanto os léptons incluem partículas como os elétrons e neutrinos. Os bósons, como o fóton ou o bóson de Higgs, são responsáveis pelas interações entre as partículas.
Embora muito eficiente, o Modelo Padrão não explica tudo. Ele não incorpora a gravidade, a matéria escura ou a energia escura, o que impulsiona os cientistas a buscar novas teorias para complementar ou superar esse modelo.
O que é a desintegração de um káon?
A desintegração de um káon é um processo em que um káon, uma partícula subatômica instável, se transforma em outras partículas mais leves. Essas transformações seguem as leis da física de partículas, em particular aquelas descritas pelo Modelo Padrão. O káon pode se desintegrar em um píon, um neutrino e um antineutrino.
Esse processo é importante porque ocorre muito raramente. De fato, menos de um káon em cada 10 bilhões se desintegra dessa maneira. Os pesquisadores estão particularmente interessados nele, pois desvios em relação às previsões do Modelo Padrão poderiam revelar novas partículas ou forças ainda desconhecidas.
Fonte: indico.cern.ch/event/1447422/