Cédric - Terça-feira 28 Outubro 2025

🌑 A origem da maior cratera da Lua posta em causa

Uma cratera lunar com dimensões planetárias, a bacia Polo Sul-Aitken, finalmente revela os segredos do seu nascimento violento. Uma reinterpretação minuciosa da sua morfologia revoluciona o cenário estabelecido da sua formação e ilumina sob uma nova luz a dicotomia fundamental entre as duas faces do nosso satélite.

Esta releitura geológica não é apenas uma simples curiosidade académica. Ela guia diretamente as próximas explorações humanas, designando a borda sul desta bacia como um destino privilegiado para a missão Artemis III. Os astronautas ali encontrariam ejectas, materiais trazidos das profundezas lunares durante o impacto, oferecendo um acesso sem precedentes à história primitiva da Lua.


A bacia de impacto South Pole–Aitken, localizada no lado oculto da Lua, formou-se durante um impacto vindo do norte (em direção à parte inferior da imagem).
Um depósito de detritos rico em elementos radioativos KREEP (em vermelho vivo) é visível apenas num lado da bacia.
Este depósito contém materiais extraídos do antigo oceano de magma lunar.
Os astronautas da Artemis aterrarão nesta zona, na extremidade sul da bacia (na parte inferior da imagem).
Créditos: Jeff Andrews-Hanna / University of Arizona / NASA / NAOJ.


Uma investigação geológica para reconstituir a trajetória do impacto



A resolução deste enigma exigiu uma abordagem que combinou várias técnicas de observação. A equipa de investigação recorreu à análise topográfica, ao mapeamento das variações do campo gravitacional e ao estudo da espessura da crosta lunar para redefinir com precisão os contornos frequentemente desvanecidos da bacia. Estes dados foram depois comparados com os de outras estruturas de impacto maiores no Sistema Solar, como as bacias Hellas e Utopia em Marte, para validar os modelos interpretativos.

O resultado desta investigação é inequívoco: a bacia Polo Sul-Aitken apresenta uma estrutura oblonga, semelhante a uma gota de água ou a um abacate, que se estreita significativamente em direção ao sul. Esta forma característica é a assinatura de um impacto oblíquo, onde a parte mais estreita indica a direção para a qual o asteroide continuou o seu percurso após o choque. Esta observação contradiz a hipótese histórica de um impacto vindo do sul.


a) Bacia SPA representada em gravidade de Bouguer.
b) Bacia SPA representada em gradientes de gravidade.
c) Topografia da bacia SPA.
d) Topografia da bacia Hellas em Marte.
e) Topografia da bacia Crisium na Lua.
f) Topografia da bacia Sputnik em Plutão.

Todos os mapas estão em projeção polar centrada na bacia, orientados para baixo de acordo com a direção suposta do impacto. As bordas das bacias estão traçadas a preto, com uma elipse média (branco) e a sua variação (cinza). Os contornos de a e b são idênticos, combinando os dois conjuntos de dados.

Esta nova trajetória, do norte para o sul, tem uma consequência direta na distribuição dos materiais escavados. A modelação indica que as ejectas, os detritos projetados das camadas profundas, acumularam-se principalmente na borda "a jusante" da cratera, ou seja, a sul. Esta previsão posiciona as futuras zonas de alunagem da Artemis numa localização geológica excecional, no topo de uma acumulação de materiais originários do manto lunar.

Um impactor que perfurou a crosta no pior momento



A Lua primitiva era provavelmente uma bola de rocha fundida, coberta por um vasto oceano de magma. Ao arrefecer, este oceano cristalizou, dando origem ao manto e à crosta. Alguns elementos químicos, incompatíveis com os minerais que se formavam, foram rejeitados no líquido residual. Este "xarope" geoquímico final, rico em potássio, terras raras e fósforo, é designado pelo acrónimo KREEP.

O estudo publicado na Nature sugere que o impacto da bacia Polo Sul-Aitken ocorreu num momento-chave, quando as últimas bolsas deste oceano de magma ainda não estavam completamente solidificadas. Os investigadores comparam este processo ao congelamento de uma lata de refrigerante: a água congela primeiro, concentrando o açúcar nas últimas gotas de líquido. Na Lua, os elementos KREEP concentraram-se nos últimos resíduos de magma, que foram expelidos para a face visível pelo espessamento da crosta do lado oculto, à maneira de um tubo de pasta de dentes apertado.

A prova deste cenário reside numa assimetria química impressionante em torno da bacia. As ejectas situadas no seu flanco oeste são anormalmente ricas em tório, um elemento radioativo característico do material KREEP. Em contrapartida, o seu flanco leste está quase desprovido dele. Esta distribuição sugere que o impacto abriu uma brecha na crosta lunar precisamente no limite onde subsistiam estas bolsas magmáticas residuais, libertando uma parte do seu conteúdo para a superfície.

A confirmação definitiva destas hipóteses depende da análise de amostras recolhidas no local. As missões Artemis, ao aterrar perto do polo Sul, terão assim a oportunidade de trazer para a Terra fragmentos destas ejectas ricas em tório. O seu estudo em laboratório permitirá datar com precisão o impacto e caracterizar a composição dos últimos vestígios do oceano de magma, oferecendo uma janela única para os primeiros instantes da Lua.

Autor do artigo: Cédric DEPOND
Fonte: Nature
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