A múmia conhecida como Bashiri, apelidada de "a Intocável", ocupa um lugar singular na egiptologia moderna. Descoberta em 1919 no Vale dos Reis, ela nunca foi aberta devido à excepcional complexidade de suas bandagens.
Estas formam um raro padrão geométrico, sem equivalente conhecido. Alguns especialistas as associam a representações arquitetónicas próximas das pirâmides. Esta singularidade levou os investigadores a privilegiar uma conservação estrita, em detrimento de uma identificação formal. Mais de um século após a sua descoberta, Bashiri permanece assim como um dos vestígios mais enigmáticos do Antigo Egito.
As análises realizadas até agora baseiam-se apenas em métodos não invasivos. Exames por raios X e tomografia permitiram estimar que o falecido era um homem adulto, com cerca de 167 cm, que terá vivido na época ptolomaica, por volta do século II ou início do século III antes da nossa era. Estes dados permanecem, contudo, fragmentários. O estado das bandagens impede qualquer manipulação direta, o que limita o acesso aos eventuais objetos funerários e inscrições suscetíveis de revelar a sua identidade e estatuto preciso.
Esta escolha metodológica insere-se numa evolução recente da arqueologia egípcia. Desde há alguns anos, os investigadores privilegiam cada vez mais as técnicas não destrutivas, de forma a preservar vestígios considerados únicos. Em 2025, várias descobertas no Egito basearam-se em imagem avançada, nomeadamente para mapear estruturas internas de pirâmides ou analisar túmulos selados. O caso de Bashiri enquadra-se nesta tendência, em que a proteção do património prevalece sobre a exploração intrusiva, mesmo quando as expectativas científicas são elevadas.
Estudos realizados sobre as resinas e tecidos de mumificação permitiram identificar misturas, por vezes associadas a rituais específicos ou a categorias sociais particulares. A riqueza e a precisão do envoltório de Bashiri sugerem um indivíduo de alto estatuto, talvez ligado a uma função religiosa ou administrativa. No entanto, na ausência de inscrições claramente legíveis, estas hipóteses mantêm-se prudentes e em aberto.
Os progressos tecnológicos alimentam, contudo, a esperança de novos avanços. Ferramentas de imagem de maior resolução, combinadas com inteligência artificial, começam a ser utilizadas para reconstituir virtualmente camadas internas sem contacto físico. Estas abordagens estão atualmente a ser testadas noutras múmias e sarcófagos. Aplicadas a Bashiri, poderiam permitir ler fragmentos de textos, visualizar amuletos ou refinar a análise anatómica, mantendo simultaneamente a integridade do sudário.
Conservada no Museu Egípcio do Cairo, a múmia Bashiri tornou-se um símbolo dos dilemas contemporâneos da egiptologia. Ela personifica a tensão entre a busca do conhecimento e a necessidade de preservar testemunhos insubstituíveis do passado.