Duas luas geladas de Júpiter, embora vizinhas e de tamanho similar, apresentam estruturas internas radicalmente diferentes. Um novo estudo sugere que essa dicotomia tem origem já na sua formação, questionando as teorias atuais.
Calisto e Ganimedes, duas grandes luas geladas de Júpiter, intrigam os cientistas há décadas. Embora sejam vizinhas e de tamanho comparável, suas estruturas internas parecem surpreendentemente diferentes.
Visão artística dos interiores de Ganimedes e Calisto. Ganimedes apresenta uma estrutura diferenciada em camadas, enquanto Calisto teria um interior pouco diferenciado, misturando rochas e gelos.
Os dados da missão Galileo revelam que Ganimedes, a maior lua do Sistema Solar, teria se diferenciado completamente em um núcleo metálico, um manto rochoso e uma crosta de gelo. Em contraste, Calisto teria mantido uma estrutura interna apenas parcialmente diferenciada, composta por uma mistura relativamente homogênea de rocha e gelo.
Uma equipe incluindo pesquisadores do CNRS Terre & Univers (ver quadro) apresenta uma hipótese inédita: essa divergência teria surgido já na fase de formação, sem necessidade de invocar eventos posteriores importantes.
Ao simular os processos de acreção no disco de gás e poeira ao redor de Júpiter, os pesquisadores desenvolveram um modelo de evolução térmica considerando todas as fontes de calor: o aquecimento radiogênico associado aos radionuclídeos de vida curta, o calor produzido pelos impactos durante a acreção, assim como a radiação térmica do disco circumjoviano.
Os resultados deste estudo sugerem que a dicotomia observada entre Ganimedes e Calisto poderia ser explicada naturalmente por condições de formação similares, assumindo uma composição idêntica e uma mesma distribuição de tamanhos de impactadores.
Suas simulações mostram que Ganimedes teria alcançado muito cedo, durante sua formação, as temperaturas necessárias para uma fusão global, enquanto Calisto, formada numa região mais fria do disco, não teria ultrapassado o limiar de fusão do gelo de água, embora possa ter incorporado uma parte significativa de impactadores grandes.
O estudo destaca que diferenças sutis, como a temperatura local dentro do disco ou a posição orbital em relação a Júpiter, podem ser suficientes para explicar trajetórias evolutivas radicalmente distintas.
Ganimedes, mais massiva e formada mais perto de Júpiter, foi exposta a impactos mais energéticos e a um ambiente mais quente, condições suficientes para desencadear uma fusão global.
Calisto, acretada mais longe numa região mais fria, manteve assim uma estrutura pouco diferenciada.
Essas conclusões questionam a hipótese dominante de que essa dicotomia resultaria de processos secundários, como bombardeios tardios ou efeitos de maré ligados a ressonâncias orbitais. A missão europeia JUICE, esperada no sistema joviano em 2031, terá um papel chave para testar essas hipóteses graças a medidas gravitacionais de alta precisão durante seus sobrevoos programados de Calisto.
Fonte: CNRS INSU