A enigmática morfologia facial dos nossos primos neandertais, caracterizada por uma mandíbula robusta e proeminente, encontra parte de sua explicação nas áreas mais desconhecidas do nosso patrimônio genético. Uma equipe da Universidade de Edimburgo esclareceu o papel determinante de uma minúscula porção de DNA, desprovida de genes, no desenvolvimento dessa particularidade anatômica.
Seus trabalhos sugerem que variações sutis nessa região reguladora podem ter influenciado a expressão de genes-chave durante a formação do rosto. Esse avanço científico baseia-se na análise comparativa dos genomas humano e neandertal, separados por apenas 0,3% de divergência.
Um crânio de Neandertal e um crânio humano são expostos no Museu Nacional da Escócia.
Crédito: Hannah Long
Os pesquisadores interessaram-se particularmente por uma sequência reguladora (um "amplificador") do gene SOX9, um ator importante do desenvolvimento craniofacial. Sua investigação revelou que alterações importantes nessa zona estão associadas, no humano moderno, a uma patologia específica que afeta o crescimento da mandíbula. Essa observação constituiu o ponto de partida para explorar a hipótese de que modificações mais discretas poderiam ter modelado, de maneira mais atenuada, a fisionomia do Homem de Neandertal.
O papel inesperado do DNA não codificante
Longamente considerada supérflua, a parte não codificante do genoma, que representa cerca de 98% do nosso DNA, é hoje percebida como um maestro da atividade genética. Ela abriga sequências reguladoras que atuam como interruptores moleculares. Sua função é modular a expressão dos genes, determinando o momento, o local e a intensidade de sua ativação sem produzir proteínas elas mesmas. A descoberta de seu envolvimento na morfogênese facial marca uma virada em nossa compreensão da evolução.
O estudo publicado na
Development concentrou-se em um amplificador preciso, identificado sob o código EC1.45, conhecido por regular o gene SOX9. Os pesquisadores compararam a sequência desse amplificador entre o Homem moderno e o Neandertal. Sua análise evidenciou três diferenças nucleotídicas pontuais, ou seja, três "letras" distintas em uma sequência de três bilhões.
Para verificar essa hipótese, os cientistas recorreram a um modelo animal, o peixe-zebra. Introduziram em embriões as versões humana e neandertal do amplificador EC1.45, cada uma acoplada a um gene repórter fluorescente de cor diferente. Essa abordagem engenhosa permitiu visualizar ao vivo a atividade das duas sequências durante o desenvolvimento embrionário. Os resultados foram inequívocos: embora ativa nas mesmas populações celulares, a versão neandertal apresentava uma atividade nitidamente superior à sua contraparte humana.
Do gene à morfologia do rosto
A observação mais significativa localizou essa atividade aumentada dentro de um grupo celular muito específico: as células progenitoras derivadas da crista neural. Essas células, fundamentais nos vertebrados, são a origem das estruturas esqueléticas da face, incluindo os ossos da mandíbula. Uma ativação mais forte do amplificador neandertal nessas células mostra uma estimulação mais importante do gene SOX9, que por sua vez poderia promover um crescimento mais robusto da cartilagem e do osso mandibular durante as etapas-chave da formação facial.
Para confirmar o vínculo de causalidade entre a atividade do SOX9 e o tamanho da mandíbula, a equipe conduziu um experimento complementar. Fornecendo aos embriões de peixe-zebra uma dose suplementar da proteína SOX9, eles observaram uma expansão notável da zona contendo as células na origem da mandíbula. Essa manipulação, que imita o efeito do amplificador neandertal mais ativo, diretamente gerou um alargamento das estruturas mandibulares em formação, corroborando a hipótese de um efeito morfológico.
Essas descobertas ilustram com elegância como modificações ínfimas em regiões reguladoras do DNA podem ter consequências anatômicas perceptíveis na escala evolutiva. A mandíbula proeminente do Neandertal não seria assim o fruto de mutações brutais em genes estruturais, mas sim o resultado de um ajuste fino da intensidade de um gene desenvolvimental. Esse mecanismo de variação oferece um modelo para compreender a diversidade facial dentro de nossa própria espécie e as bases genéticas de certas malformações congênitas.
Para ir mais longe: O que é o genoma não codificante?
O genoma não codificante designa a vasta maioria do nosso DNA que não contém as instruções diretas para fabricar proteínas. Ele era antigamente qualificado como DNA "lixo". As pesquisas recentes estabeleceram seu papel na regulação dos genes. Ele atua como um painel de controle, determinando quais genes são ativados, em que momento e em quais células.
Ele compreende sequências reguladoras como os promotores e os amplificadores. Essas regiões servem como sítios de fixação para proteínas especializadas que orquestram a leitura da informação genética. Suas variações, mesmo mínimas, podem modificar a anatomia sem necessariamente provocar doenças, contribuindo assim para a diversidade natural das populações.
Ao contrário dos genes codificantes cujas mutações são frequentemente deletérias, as mudanças no não codificante permitem uma evolução mais gradual e matizada dos traços físicos. O estudo dos genomas antigos revela como esses ajustes modelaram a evolução humana. Eles representam um campo de investigação para a genética médica e evolutiva.
Autor do artigo: Cédric DEPOND
Fonte: Development