Cédric - Sábado 23 Agosto 2025

🌊 90 mil milhões de litros de água fracturaram de uma só vez o gelo da Gronelândia: um dilúvio sem precedentes

Uma força titânica, invisível e silenciosa, despertou sob os gelos imaculados da Gronelândia. Em 2014, um lago escondido sob centenas de metros de gelo libertou abruptamente o seu conteúdo, desencadeando um dilúvio de poder inaudito que literalmente fez explodir a superfície gelada.


Crédito: dados Copernicus Sentinel modificados (2024), processados pela ESA

Até agora, os cientistas imaginavam que as águas de degelo fluíam suavemente da superfície para a base do gelo para chegarem ao oceano. A realidade revela-se muito mais espetacular e violenta. O estudo deste fenómeno, tornado possível nomeadamente por uma análise minuciosa dos dados dos satélites europeus Sentinel e CryoSat, revela que o movimento inverso é possível: a água pode subir em direção à superfície com uma força capaz de pulverizar o gelo no seu caminho.

Um cataclismo subglacial de uma amplitude sem precedentes



O evento ocorreu numa região isolada do norte da Gronelândia, onde os cientistas identificaram um lago subglacial até então desconhecido. A sua drenagem súbita provocou uma onda de choque hidráulica de uma intensidade rara. No espaço de apenas dez dias, 90 milhões de metros cúbicos de água jorraram para a superfície, escavando uma cratera impressionante de 85 metros de profundidade numa área de 2 quilómetros quadrados.

A violência do fluxo não criou apenas esta cratera aberta. A jusante, a paisagem glacial foi transformada num campo de ruínas geladas, onde enormes blocos com a altura de edifícios de oito andares foram arrancados e dispersos. A superfície, lavrada pelo torrente, ostenta os estigmas desta prova, visivelmente distinta do degelo comum causado pelo aquecimento do ar.


Drenagem catastrófica de um lago subglacial.
O escoamento superficial alimenta um lago pressurizado na base da geleira. A sobrepressão abomba a superfície do gelo, depois um cisalhamento horizontal inicia uma hidrofractura (modo II) que se propaga para cima, atinge a superfície e cria uma conexão leito–superfície. A drenagem brutal que se segue desencadeia uma cheia subglacial: o gelo é rasgado, blocos de aproximadamente 25 m de altura são dispersos e ~6 km² de superfície gelada são desnudados, deixando uma bacia de colapso acima do lago drenado.

O que torna este episódio particularmente intrigante para os glaciologistas é a sua localização. Ocorreu numa zona onde os modelos teóricos previam que a base do manto de gelo estava permanentemente congelada sobre o leito rochoso, tornando tal fenómeno hidráulico impossível. Esta contradição flagrante mostra que os nossos conhecimentos sobre as condições reinantes sob o gelo ainda estão incompletos.

Consequências potenciais para o futuro do manto de gelo


A descoberta, publicada na revista Nature Geoscience, implica que os processos hidrológicos sob o manto de gelo são bem diferentes e mais dinâmicos do que o previsto. Os investigadores avançam que a pressão extrema da água deve ter provocado uma fracturação do gelo desde a sua base, criando falhas e condutas por onde o fluxo pudo irromper para ganhar a superfície.



Esta subida explosiva de água levanta questões importantes sobre a estabilidade mecânica do manto de gelo. Tais eventos, se se repetissem ou se intensificassem, poderiam potencialmente afetar o fluxo global de gelo para o oceao, alterando a lubrificação da sua base. O seu impacto na perda de massa total do manto de gelo permanece por quantificar.

A lição mais imediata é talvez a contestação dos modelos utilizados para prever a evolução do gelo da Gronelândia. Estes últimos não têm em conta este tipo de mecanismo de fracturação e subida de água. Integrar estes novos processos tornou-se uma prioridade para melhorar a fiabilidade das projeções sobre a contribuição do manto de gelo para a elevação do nível do mar.

Autor do artigo: Cédric DEPOND
Fonte: Nature Geoscience
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